AS MINHAS DIGITAIS NÃO ESTÃO NOS MEUS CABELOS - Crítica

      No discurso, a mulher pode ser o que ela quiser, mas parece que isto não vale para a mulher negra, enquanto todas as demais mulheres podem ou parecem poder tudo o que elas quiserem, a mulher negra como se não bastasse tudo o que já se opõe a ela, ainda se depara com uma objeção sem lógica e racista quanto ao como ela deve usar, deixar, manter os seus cabelos.

      Dizem que quando a mulher negra alisa os seus cabelos, ela perde a sua identidade, que ela tem que manter os cabelos como originalmente eles são, pelo menos no que diz respeito ao seu aspecto crespo ou seja, ela pode até pintar mas não alisar e esse discurso conquistou um espaço e ganhou uma repercussão tão grandes que alisar os cabelos é como se fosse uma verdadeira negação da raça, pior, uma troca de identidade ou perda dela, como insistem em dizer.

      A mulher pode o que ela quiser... mas a mulher negra não? Ela só pode parte do que ela quiser? Todas as demais são livres para terem os seus cabelos como bem quiserem, porém as negras tem que observar regras? Como se tivessem um manual a seguir? E por que essas regras, de quem são?

      Todas as demais mulheres são livres para decidir que aparências querem ter, mas às negras impuseram uma regra, com o argumento de que "quando se alisa o cabelo se perde a identidade". Contudo, quando essa mesma mulher negra raspa a cabeça, coloca um aplique rastafári, pinta de qualquer cor que deseja, amarra um lenço, faz tranças, usa um turbante, não dizem que ela perde a identidade. Porém quando alisa, sim.

      Isto não seria preconceito, imposição, secionamento de direitos? Somente as de cores claras podem ter cabelos lisos? É um direito concedido apenas a elas?

      Elas podem fazer o que bem entendem com seus cabelos (e podem mesmo), que elas não perdem a identidade (o que é verdade), se tem a pele clara; as de cabelos escuros podem pintar de qualquer tom de louro, de ruivo, da cor que quiser que ninguém diz que elas perderam suas identidades, as loiras podem pintar de qualquer tom escuro (sim, podem); se tem a pela branca, clara, podem alisar, encaracolar, fazer o que for que ninguém diz que a identidade foi perdida (e isso é verdade); já as negras... elas até podem fazer uma série de coisas com seus cabelos, como as que eu citei, que não dizem interferir na identidade delas, mas alisar sim, porque os cabelos lisos não são os nossos originais, não nascemos com eles. E por acaso nascemos de rastafári, com dread ou de turbante? E por que quando a mulher negra ou o homem usa tais adereços em seus cabelos ou em suas cabeças não dizem que eles nos fazem perder a identidade?

      Como usamos ou usarmos os nossos cabelos, é ou pelo menos deveria ser uma opção de cada um de nós, sem a obrigação, é lógico, de nenhuma das chamadas "ditaduras" da beleza e sem, é claro, essa imposição descabida, acompanhada desse argumento também descabido, que relacionam identidade com aspecto de cabelo. 

      Não compro essa ideia de que como eu conservo ou deixo de conservar os meus cabelos, interfere na manutenção ou no desfazimento da minha identidade.

      Eu não sou ou deixo de ser de acordo com o como estão os meus cabelos, a minha identidade independe disto. Já a autoestima, não posso negar, às vezes ela depende sim e não vejo nada de grave nisto, cada um deve se manter como se sente bem e sem a imposição de conceitos alheios. 


      As minha digitais não estão nos meus cabelos.


    

Comentários

Selma disse…
Concordo é assino seu lugar de fala.
Somos livres e não temos que seguir e nem sentirmos coagidos por esse tipo de regra imposta por quem quer que seja.

Parabéns!!!!!!
Amiga me desculpe mais uma vez, realmente eu ainda não tinha visto seu comentário!

Pois é; mas é incrível, ou melhor decepcionante como essa discussão tem ocupado espaço... enquanto quem deveria ganhar espaço são os donos ou as donas dos cabelos e não o fato de como os negros devem ou não usar, manter os seus cabelos.
Algumas pessoas brancas pensam estar incentivando e até valorizando os nossos cabelos crespos e não deixam de estar; até extrapolarem em seus comentários e sem se darem conta, acabam sendo racistas.

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